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Crítica//El Cuerpo Vacio

Nityama Macrini

 

 

 

 

 

 

 

 

O corpo enquanto espaço para diferentes vozes

Isabella de Andrade

Os dançarinos mexicanos Shantí Vera e Sendic Vázquez levaram uma mistura interessante de elementos para o palco do MID 2019. Trabalho de corpo, sons, ruídos, elementos plásticos, palavras e cores simbólicas se uniram para dar voz ao contexto criativo que emana da América Latina.

 

A coreografia El Cuerpo Vacio faz parte do projeto Cuatro x Cuatro, um laboratório de artistas formado em 2007. A dupla demonstra intimidade e bom diálogo em cena, o que parece ser resultado de um tempo maior de convívio em processos de criação.

A narrativa da apresentação chega ao público em diferentes fases. No início, acompanhamos uma movimentação corporal mais estanque, com processos constantes de repetição. A dupla parece demonstrar as possibilidades de conexão entre os corpos e sua relação com o espaço ocupado por eles. Para desempenhar cada movimento, os dançarinos exploram diferentes níveis de experimentação, planos, pesos e contra pesos.

 

A coreografia me remete a diferentes estágios e estados possíveis na convivência entre seres, sejam eles complementares ou opostos. Desde o início, as mãos preenchidas pelo azul da tinta convidam nossos olhares a se colocarem de maneira mais atenta em relação a essas partes. As mãos nos guiam pelo espaço da cena e parecem ser o pontapé inicial para o movimento dos corpos e pelo diálogo proposto entre os dançarinos.

A dupla aproveita os espaços criados pelo próprio palco, dialogando com paredes, piso, corrimão, escadas e tecidos do chão. O experimento parece buscar um frescor constante, que se modifica em pequenos pontos a cada nova cidade, região ou país visitado. A dança quebra a quarta parede em uma desconstrução cênica, colocando-se lado a lado com o público. Os momentos de interação criam mais proximidade e atraem nossos olhares para a experimentação dos dançarinos.

O figurino ganha novos tons na segunda metade do espetáculo e os intérpretes passam a circular com um vermelho vivo. Em cena, movimentos corporais quase silêncios aparecem em oposição aos gritos angustiados de um dos performers. Por vezes, penso na necessidade da presença do grito. Seria ele uma forma de dar mais força aos movimentos, de externar algum ponto de emoção que precisa reverberar ou apenas uma espécie de fuga? O público ri nesses momentos. Creio que os sons e ruídos provocados pelo intérprete criem uma espécie de confusão no clima proposto pela coreografia.

 

Quase ao fim, uma nova integrante sobe ao palco de maneira tímida e quase invisível para ler alguns textos de protesto. Ao mesmo tempo em que barreira da língua nos impede de entender cada palavra, nos deixamos levar pela força da expressão que carregam. Simultaneamente, um ritmo latino invade o espaço e é embalado por uma dança frenética, que se mostra apenas pelas pernas de um dos intérpretes. Música, palavras e o ritmo nos pés criam uma intensa atmosfera latina. Creio que seja esse o ponto alto de El Cuerpo Vacio. Em cena, algo de protesto se mistura com o frenesi do ritmo latino.

 

A dupla parece cumprir o que promete, despertando uma atenção mais cuidadosa ao encontro dos corpos. Logo, eles se transformam no ponto de partida para o contato com o restante do mundo e a proposta que busca ocupar espaços para pensar e estar juntos cria um diálogo, ainda que tênue, com o público presente.

Isabella de Andrade é jornalista, atriz e escritora. Graduada em Comunicação Social e Artes Cênicas pela Universidade de Brasília, foi repórter de cultura por três anos no Correio Braziliense e arte-educadora no CCBB. Tem dois livros publicados e é idealizadora do projeto cultural www.ociclorama.com.

El Cuerpo Vacio
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